Coincidência ou não, foi também em 17 de novembro de 1945 que Fidel Alejandro Castro Ruz ingressou no curso de Direito da Universidad de La Habana. Nascera 19 anos antes, filho de Ángel Castro, rico latifundiário espanhol com Lina Ruz, que trabalhava nas propriedades deste. Ángel era casado com Maria Luisa Argota, com quem teve dois filhos. A mulatinha de 14 anos chega à casa para trabalhar e logo encanta o espanhol com brejeirice e graça. Os dois iniciam uma relação extraconjugal que resulta no nascimento de Ângela, Ramon e Fidel. Com o nascimento do terceiro filho do marido com a serviçal, Maria Luisa sai de casa e entra com o pedido de divórcio litigioso na Justiça contra o ex-marido. Numa tentativa de livrar-se do flagrante, Ángel então envia Fidel a Santiago de Cuba com quatro anos de idade e, apenas aos 17, é reconhecido legalmente pelo pai.
Segundo relato de amigos, a rejeição sofrida pelo jeito rude e distante que o pai lhe dispensava, levou Fidel a querer destacar-se em todas as atividades que exercia. Seu porte avantajado o ajudou nos esportes, tornando-se campeão universitário em diversas modalidades. Já os inimigos, o acusam de ter herdado a megalomania e o autoritarismo de Ángel, fazendo buscar desde e para sempre o poder acima de tudo. Durante os anos como universitário, travou embates políticos dentro da instituição, quando fez parte da União Insurrecional Revolucionária e da Federação Estudantil Universitária, da qual aspirou ao cargo de líder, sendo derrotado nas urnas. Em sua formatura em 1950, Ángel não esteve presente. Nove anos mais tarde, conquistaria o poder através da revolução.
Por isso, até hoje, o dia 17 de novembro é comemorado em Cuba e Fidel é saudado por seu povo. Em 2005, voltou à Universidade onde fez um discurso de oito horas, transmitido ao vivo pelas emissoras para todo o país e reprisado repetidas vezes durante vários dias seguidos. Entre os assuntos, relembrava os tempos de estudante, o triunfo da revolução, destacava os êxitos de seu governo, atacava o imperialismo ianque e, por fim, anunciava novas medidas adotadas em diversas áreas da administração pública. O povo ouve atentamente seu comandante e repercute as notícias. Dono de um estilo próprio que inspirou outros líderes da América Latina, Fidel fala sem interlocutores, tendo todo o aparato do Estado e da imprensa a seu favor.
Por toda a universidade, as celebrações são muitas. Nas escadarias do acesso principal, estudantes levam faixas com mensagens de apoio, como a que repetia uma frase do comandante: Aqui me hice revolucionário. No jardim, onde seria montado o palco para o espetáculo musical da noite, uma enorme bandeira mostrava a face de outro ícone da revolução: Ernesto Guevara de la Serna, El Che. Nas classes para estrangeiros, os alunos aprendem a letra de Guantanamera, canção-símbolo do povo, escrita pelo herói nacional da independência cubana, José Martí em parceria com Joseíto Fernandéz. Em frente ao salão denominado Aula Magna, centenas de universitários – cubanos e estrangeiros – se espremem para esperar pela chegada de Fidel. Crianças do ensino primário são postadas na frente de onde deve parar a comitiva e ensaiam uma canção em sua homenagem. Os poucos estudantes escolhidos para assistir ao vivo o discurso são eleitos dentre as lideranças estudantis.
De repente, um cochicho toma conta dos presentes. Todos se entreolham e observam ansiosamente o portão de entrada da universidade. Apreensão, mãos suadas, quase trêmulas. Mesmo aqueles que não o admiram estão lá para ver se o homem é mesmo de carne e osso. Um carro desses da década de 50, com vidros fumes entra rápido portões adentro e freia quase em cima da multidão. Pelas portas traseiras, saem, um de cada lado, dois homens altos, carrancudos, ternos negros, metralhadoras nas mãos. Imediatamente, outro carro idêntico repete a mesma ação, quase batendo no pára-choques do primeiro. Ninguém sai. Como em um filme de ação estadunidense, um terceiro automóvel faz a mesma coreografia alguns segundos depois, saindo mais dois seguranças como clones dos homens do primeiro carro.
Os quatro leões de chácara voltam-se para as portas traseiras do segundo automóvel e de dentro dele sai Fidel. Vestido com sua inconfundível guaiabeira verde-oliva, coturnos negros, o comandante-em-chefe segue rumo à multidão. Suas feições nem de longe lembram a do guerrilheiro que desceu de Sierra Maestra rumo ao comando do país, onde se mantém há 47 anos resistindo ao bloqueio econômico, atos terroristas e tentativas de assassinato. A menos de cinco metros de Fidel, os estudantes podiam ver seu rosto envelhecido, os movimentos lentos, a expressão serena. Assistiu à apresentação das crianças, riu e brincou com elas. Depois entrou e proferiu seu pronunciamento de oito horas, sem se sentar e, por três ou quatro vezes apenas, tomar goles de água.
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