segunda-feira, dezembro 08, 2014

A senha do cartão

Você não me conhece
Mas isso não impede
Que julgue minhas atitudes
Então passa lá no balcão
E digita a senha do cartão.

O que é a vida II

Pergunta filha da puta
Vida é luta
O resto é coxinha
Ou poesia.


sexta-feira, novembro 28, 2014

Juro que pensei



Taquicardia
Palpitação
Histeria
Agitação

O que tanto anima a gente diferenciada?
Um velho tucano de roupa nova e engomada?
Um blindado verde-oliva a calar o carnaval?
Corte de gastos públicos e arrocho salarial?

Qual nada! Diz-se que é a tal bleque fráidei
Chega causando confusão entre os desavisados
Não vivíamos em pleno bolivarianismo?

Juro que pensei
Só se esqueceram de guilhotinar o consumismo
E alertar os endividados.

sábado, novembro 08, 2014

Brasil, um país de todos



Se for um gaúcho atrevido
Ande pelado na rua
Se for bonita e famosa
Deite no asfalto e faça troça
Se for feio, pobre e nordestino
Fique na sua.

segunda-feira, setembro 29, 2014

Arbítrio

Orientam seu voto
Norteiam seu rumo
Sufragam seu sexo
Mapeiam seu consumo

Enquadram seus sentidos
Interpretam seu pensamento
Deliberam sua consciência
Compram sua escolha

Te cobram coerência
Taxam suas decisões
Condenam seus atos

Atam seus punhos
Amordaçam sua boca
Retiram o seu ar.

Ciço Pereira, 29 de setembro de 2014.

segunda-feira, agosto 04, 2014

Espanto

- Caiu?
- Se jogou.
- Homem?
- Mulher.
- Ainda bem que não atrapalhou o trânsito.

Largo do Machado
Mas não largo do celular
Cacilda não breca o corpo
Na última e definitiva dança

Selfish, selfies e self made men
A vida humana já não vale um espanto
A morte já não causa mais o pranto.

quarta-feira, fevereiro 26, 2014

Rio de Fevereiro

Dez da manhã de quarta-feira pré-carnaval e ouço de minha janela a banda tocando “Cabeleira do Zezé”. No Rio de Janeiro, o carnaval chega antes e vai embora depois... ou melhor, o carnaval não acaba... o Rio é o carnaval e o carnaval é o Rio. Ambos se confundem. Ambos são irreverentes, não se levam a sério, riem de si mesmos, são oposição, contrários à ordem vigente, anárquicos... 

Mas, nos últimos tempos, nossos governantes teimam em contrariar nossa própria vocação, tentando impor mais lei, ordem, controle, segurança... palavras que definem um sentimento de medo profundo de uma pequena parcela da sociedade contra a maior parte de nossa população... o medo está atrelado ao preconceito, ao distanciamento, ao desconhecimento do outro, do estranho... que está ali, do seu lado e é, ao mesmo tempo, tão diferente, mas tão igual a você.

É por isso, meus amigos, que proponho o rebatismo de nossa cidade para São Sebastião do Rio de Fevereiro. Uma refundação que represente uma cidade mais democrática, mais alegre, mais viva, mais feliz. E, ao mesmo tempo, menos institucional, menos oficial, menos gentrificada, menos mercadológica, menos fria, menos desumana...

E bom carnaval a todos!

segunda-feira, fevereiro 24, 2014

O estranho em mim


Avistei-o de longe na mesma calçada. Com medo no olhar e movimentos diametralmente opostos. Pé ante pé. Como uma imagem refletida no espelho das ruas. Entre rostos indistinguíveis na multidão, enxerguei meu estranho, aquele a quem abomino em mim mesmo. 

Temi-o tal qual a possibilidade do confronto com minhas mais inconfessáveis angústias. Meu anti-herói, meu alterego do avesso. A iminência do encontro fazia-me suar sob o calor saariano. Senti as gotas de suor rolando face abaixo de minha imagem e semelhança. 

Engraçadamente constrangedor, atemorizadoramente embaraçoso. A tentativa de não coincidir os passos que convergiam para o mesmo ponto foi desesperadora. Um movimento à direita meu, um à direita dele. Um gesto à esquerda de cá, um à direita de lá. Sincronicamente combinados e estávamos frente à frente. 

A pressa dos transeuntes, o pavor de cruzar olhos nos olhos, o risco de um esbarrão acidental que nos tirasse de nossas individualidades invioláveis guiaram-nos à tentativa infrutífera do desencontro. 

Inútil evitar. Esbarramos nossas privacidades, trombamos nossas diferenças, roçamos nossas idiossincrasias, misturamos nossas idiotias, nos perdemos em nossos preconceitos, para, ao fim, confundirmo-nos em nossas identidades.

E tudo acabou num sorriso.


Ciço Pereira
Rio, 24/02/2014.

terça-feira, fevereiro 11, 2014

Aos trinta e cinco

Singro as águas revoltas do rio ao largo da costa
Castigam-me o vento, a chuva, o sol e o sal
Mantenho o torso desnudo e a pele exposta
Procuro em porto seguro abrigo de todo o mal

Olhos marejados, corpo exausto, pernas e braços reagem
O medo se faz companheiro de viagem
O erro ensina e nos traz a coragem

Do alto da montanha avisto-me ao barco
Vejo-me ao longe, ao passo e ao largo
Afasto-me para contemplação e reflexão
Erro e acerto, sucesso e fracasso
Corrigindo a rota, realinhando o prumo

Serenidade, paciência
Temperança, resignação
Bom humor, persistência
Foco e determinação
Indispensáveis em qualquer navegação

Sigo em águas tranqüilas ou bravias
Instabilidade sujeita a calmarias
Onde o porto seguro é passageiro
E a liberdade além da linha do horizonte.

Ciço Pereira
10 de fevereiro de 2014.

sexta-feira, janeiro 31, 2014

Erre

Erre não é um nome
Mas sim, um destino
Destinado a seguir por uma linha torta
Pois a reta não mais lhe importa

Erre porque aquilo que chamamos “certo”
É oposto do que a vida lhe reserva

Erre é a fuga do padrão
O novo, o duvidoso, a revolução

Erre é o reflexo inverso do tédio
Erre é o não sentir medo
De experimentar o avesso do acerto
É o erro que ensina

Parabéns, Erre, meu fraterno amigo reverso.

Ciço Pereira, 30 de janeiro de 2014.

terça-feira, janeiro 28, 2014

Carta aberta aos moradores da cidade do Rio de Janeiro




Rio, 28 de janeiro de 2014.

Sorria, você está no Rio de Janeiro! Esta é a cidade que turistas do mundo inteiro desejam visitar nos próximos anos. Afinal de contas, fomos contemplados com o direito de sediar a Copa do Mundo Fifa e os Jogos Olímpicos. Habitantes de todo o planeta Terra cobiçam nossas praias, montanhas, belezas naturais, admiram a nossa simpatia, hospitalidade, amizade, irreverência. É aqui onde desfilam os famosos atores globais reconhecidos em todo o país e nós, cariocas, agimos como se fossem nossos velhos conhecidos, quando esbarramos com um deles caminhando pelo belíssimo calçadão de Leblon ou Ipanema. Agora temos favelas pacificadas onde o turista poderá passear a bordo de um jipe, no melhor estilo safári, observando como vivem os exóticos favelados, habitantes de casebres de alvenaria e sobrevivem sem saneamento básico, mas que agora podem desfrutar de serviços de tv a cabo, internet e energia elétrica, desde que paguem o preço cobrado pelas empresas fornecedoras. Nosso visitante também poderá ouvi-los tocar um samba de primeira e provar de quitutes típicos dessas comunidades que seus habitantes denominam arroz, feijão, bife e batata frita (rice, beans, steak and french fries).

Portanto, carioca e morador da Cidade Maravilhosa, alegre-se! Você é um privilegiado! Coloque um sorriso no rosto e... espere, não se mexa! Não saia de onde você está! Afinal de contas, um caminhão que estava a serviço de nossa Prefeitura derrubou uma passarela na Linha Amarela, matou quatro pessoas e imobilizou a população moradora daquela parte da cidade. Já o centro da cidade está parado para que possamos erguer o Porto Maravilha, um empreendimento onde serão instalados restaurantes e lojas e atracarão navios de luxo de toda a parte do mundo, no lugar onde outrora viviam moradores pobres e supostamente viciados em crack que foram levados para... ah, deixem isso pra lá. E você, que precisa utilizar os serviços da Supervia, nossa empresa concessionária de trens urbanos, também vai precisar ter muita paciência. É que uma composição descarrilou na semana passada, deixando 600 mil pessoas a pé e o serviço ainda não foi completamente restabelecido. Resigne-se, lembre-se das gargalhadas do nosso secretário de Transportes e ponha você também um belo sorriso no rosto!

Mas anime-se, estamos no verão, a estação do ano favorita de todo o carioca! Afinal, não somos o povo que não trabalha e passa os dias na praia? Temperaturas acima dos 40 graus que você pode usufruir nas ruas, trens e ônibus sem ar-condicionado. Ah, claro, só não se esqueça de que as tarifas vão aumentar em breve... hauahauahaua... agora, sim, sabemos o motivo da risada do queridão Júlio Lopes... muito espirituoso esse rapaz. Janeiro é também o mês do pagamento do IPVA e do IPTU! E este ano, teremos um pequeno reajuste... mas nada que você que não tem rede de esgoto, rua asfaltada e energia elétrica eficiente perceberá tanto assim a diferença.

Mas, calma, gente, logo logo estaremos no carnaval! A festa popular mais democrática do Brasil! Você já comprou o seu ingresso para a Sapucaí? Não? Ah, eles esgotaram em 15 minutos, porque as agências de viagens e os cambistas compraram tudo? Bom, se você não puder pagar o preço, poderá assistir a tudo em detalhes na emissora do plim-plim, com comentários esfuziantes e detalhes dos bastidores... imperdível! Ah, não curte escola de samba? Prefere carnaval de rua? Então corra para espremer-se em qualquer um dos blocos regularizados pela Prefeitura, ter o seu celular roubado, tomar aquela cervejinha daquela única marca igualmente autorizada pelo poder municipal e depois esperar algumas horas nas filas das dezenas de banheiros químicos disponibilizados para os milhares de foliões espalhados pela cidade. Só cuidado para não urinar na rua ou jogar lixo no chão. Você poderá ser multado ou mesmo detido pela nossa valorosa Guarda Municipal.

Em junho, não esqueçamos, teremos a tão esperada Copa do Mundo! Se você não pretende deixar a cidade, sugerimos que reserve aquele dinheiro que economizou durante os últimos anos para poder sobreviver no Rio de Janeiro. Foi pensando neste megaevento que centenas de moradores foram removidos de suas casas para que fossem construídas instalações esportivas e para que pudessem ser construídos corredores expressos de ônibus. É também por este motivo que atualmente paga-se até R$ 500 mil pelo aluguel de um barraco na favela. (Aos antigos moradores que, por ventura, não disponham da módica quantia, é facultado o direito de se mudarem para os bairros periféricos, a 40, 50 km do centro e servirem-se das linhas de trem administradas com excelência pela briosa Supervia.) Se você foi contemplado com um ingresso no sorteio da Fifa, poderá frequentar o estádio do Maracanã durante a Copa do Mundo e consumir os produtos à venda por lá: água a R$ 5, cerveja a R$ 9 e hambúrguer a R$ 15. Mas deverá comportar-se: é proibido levar lanchinho de casa, portar bandeiras, tirar a camisa ou mesmo reclamar mais efusivamente das marcações da arbitragem, sob o risco de ser retirado sumariamente das imediações do estádio.

E, por fim, em outubro, teremos a festa da democracia! Eleições para a Presidência da República, governos estaduais e Congresso Nacional. Está em suas mãos escolher os seus representantes que brigarão pelos seus interesses nas respectivas esferas governamentais. O voto é a sua arma! Esqueça que nossos representantes são financiados por empreiteiras, bancos, seitas religiosas, agronegócio, indústrias de armas e mesmo grupos criminosos e que é, de fato, para eles que nossos parlamentares legislam, julgam e executam.

O quê? Não ficou satisfeito? Cale a boca! Afinal de contas, vivemos em uma sociedade liberal, com liberdade de comércio e liberdade de expressão... apenas para aqueles que detém concessões públicas de radiodifusão, conseguem financiamentos públicos ou privados para construir seus aparatos midiáticos, difundir suas ideias e defender seus interesses. Portanto, denuncie as rádios comunit... digo, rádios piratas, aquelas mesmas que derrubam os aviões que você um dia poderá viajar, caso possa pagar pelas passagens aéreas. Não, também não vá para as ruas protestar! Isso é coisa de vândalos e Black blocks, que depredam o patrimônio público e privado e ameaçam a segurança do “cidadão de bem”, ou seja: você, morador da zona sul, branco, rico e letrado.

Contente-se, portanto em ligar sua televisão, assistir ao futebol, à novela e dar risada no domingão, tomando uma cerveja estupidamente gelada (e você, já?). Segure firme o seu controle remoto, curta, compartilhe, compre e pague em 12 vezes sem juros! Ah, claro, e reze para continuar vivo e não morrer de uma bala perdida, ter sua casa levada pela chuva ou mesmo ser alvejado por uma passarela sobre a sua cabeça. O resto, deixe que eles resolvem, lá nos palácios, mesas de reuniões, jantares de negócios, coberturas triplex e latifúndios. Eles garantem que o seu direito termina onde iniciam os riscos à “segurança”, à “lei” e à “ordem”, o que quer que essas palavras signifiquem. Lei esta que pode ser relegada a último plano em caso de “necessidade”, da mesma forma, o que quer que isto queira dizer. Afinal de contas, devemos fazer de tudo para proteger a “democracia”, mesmo que isto represente esquecer a própria Democracia...



Ciço Pereira.

quinta-feira, janeiro 09, 2014

O Maranhão é aqui


No Maranhão
Só come salmão
Quem mora no Palácio do Leão

Da família Sarney
Só o que sei
É que eles não querem saber
De quem dorme no xadrez

No século XXI
Decapitados são os que passam fome
Estivéssemos no XVIII
Perderiam a cabeça aqueles que têm um nome
De abastados, letrados, mancomunados

Encarcerar para não recuperar
Esta é a lei
Não só dos Sarney

Desde Cabral e Dom João
Trancafiar é a solução
Para conter aqueles que não têm educação

São mortos todos os dias
Nos presídios, favelas e periferias
Pretos, pardos, índios, pobres, jovens, imigrantes

É a sujeição criminal
O suposto agente de todo o mal
Causado contra o cidadão de bem
Que faz bem a si mesmo e a mais ninguém.


Ciço Pereira, 09/01/2014.