sexta-feira, maio 04, 2007

Os filhos da época

Somos os filhos da época,
e a época é política.
Todas as coisas - minhas, tuas, nossas,
coisas de cada dia, de cada noite
são coisas políticas.
Queiras ou não queiras,
teus genes têm um passado político,
tua pele, um matiz político,teus olhos, um brilho político.
O que dizes tem ressonância,
o que calas tem peso
de uma forma ou outra - político.
Mesmo caminhando contra o vento
dos passos políticos
sobre solo político.
Poemas apolíticos também são políticos,
e lá em cima a lua já não dá luar.
Ser ou não ser: eis a questão.
Oh, querida que questão mal parida.
A questão política.
Não precisas nem ser gente
para teres importância política.
Basta ser petróleo, ração,
qualquer derivado, ou até
uma mesa de conferência cuja forma
vem sendo discutida meses a fio.
Enquanto isso, os homens se matam,
os animais são massacrados,
as casas queimadas,
os campos se tornam agrestes
como nas épocas passadas
e menos políticas.

De WISLAWA SZYMBORSKA, poetisa polonesa, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura de 1996.
Tradução: Ana Cristina César

2 comentários:

Anônimo disse...

Não tem como fugir né? Então, temos que assumir de vez? Queria ser uma planta...

Anônimo disse...

Ahhhhh, brincadeirinha, hehehe.
Falando sério, já que não somos uma tranquila samambaia, todo mundo devia ter pelo menos 10% de Che Guevara. Ihhh, escrevendo já me arrependo, tem tanto brasileiro "Che Guevara", né? Os anônimos revolucionários que enfrentam guerras diárias lutando pela própria sobrevivência, pelo básico: teto e alimento. Isso, isso mesmo, o básico para qualquer animal sobreviver. Mas ai você vai me dizer que somos mais que isso. É, concordo. Somos os bichos pensantes criados pelo Todo Poderoso, pra deixar esse planeta mais divertido (pelo menos pra Ele né). E é nessa racionalidade que consiste toda confusão.
Que trabalhão saber que somos explorados, ou que vivemos a custa da exploração do trabalho de outros.Que chato descobrir que a maioria dos nossos desejos não são originalmente nosso, mas fruto de uma manipulação, a cada dia mais dissimulada e por isso sutil, e por isso difícil de perceber, e por isso mais difícil ainda de combater.
Tá bom, tá bom Ciço, de agora em diante, não vou esquecer que além de bicho que pensa, sou um bicho político também...